Há muitos anos atrás, tal como ainda hoje, as pessoas da Praia tinham muita fé em Santo Cristo e à sua festa, vindos de toda a ilha, acorriam muitos romeiros, que acreditavam nos milagres que Ele operava. Nesse dia a Praia enchia-se de alegria e gente que vinha pedir ou agradecer a Santo Cristo alguma graça.
Vendo todo este fervor em redor do Santo Cristo que estava na Praia, alguém importante da Igreja ou os poderosos da cidade quiseram levar a imagem de Cristo crucificado para um lugar mais digno, uma igreja mais imponente da cidade da Horta. O povo da Praia ficou muito aborrecido com o que lhes queriam fazer, alguém chegou mesmo a levantar a voz e dizer que, se o crucifixo tinha passado tantas ilhas e tantos portos a boiar sobre o mar e só tinha vindo parar na areia da Praia do Almoxarife, era porque queria ficar ali. Mas nada conseguiu esse habitante da Praia.
Um certo dia lá chegou a comitiva para levar a imagem. Alguns homens foram encarregados de transportar o Senhor Crucificado, que deixou a Igreja, debaixo do choro de muitos paroquianos.
A procissão foi andando pelas ruas da Praia, em direcção à cidade. Até certa altura correu tudo muito bem, mas, quando chegaram ao cabo de cima da ladeira, o crucifixo tornou-se muito pesado, tão pesado que ninguém o conseguia arrastar, mesmo que se juntasse a força de vários homens.
Sem saber o que fazer, resolveram trazê-lo de volta para a igreja da Praia e esperar melhor oportunidade. Assim que se voltaram para baixo, o crucifixo ficou leve, tão leve que qualquer homem, mesmo muito fraco, o trazia com facilidade.
Ainda outras vezes tentaram levar a imagem para a cidade, mas acontecia sempre o mesmo, até que as pessoas incrédulas compreenderam que Santo Cristo queria estar na Praia do Almoxarife.
E lá se ficou até hoje. Aos poucos, a freguesia começou a ser conhecida por Praia de Santo Cristo e, na Rocha Vermelha, junto ao lugar da praia onde o crucifixo tinha aparecido, nasceram poderes de cravos goivos que ainda hoje nascem ali sem ninguém os semear, para indicar o lugar onde Santo Cristo quis fazer morada.
De “Açores, Lendas e Outras Histórias”, recolha de textos de Ângela Furtado Brum